Naquele fim de tarde o Bosque reunira inteiro. A notável assembleia de Acácias, Cedros e Pinheiros ponderava, em samaritano segredo, adoptar Alice. A rebelde fedelha causara já demasiados estragos. Ignorá-la deixara de ser possível. Mais por prudência que generosidade, uma parte substantiva da floresta queria-a inter pares. Outra parte, bem menos expressiva mas igualmente importante, conspirava, ininterruptamente e há vários dias contra si. A curiosidade desenfreada da menina-orfã-humana era intolerável para muitos dos presentes. Já que a liberdade tem o dom de acossar as sombras.
Posto isto, ninguém estranhou ao saber-se que a grande família dos Hibiscos alertara os guerreiros Bonsais para as funestas intenções de criaturas como as Heras, as Glicínias e as Damas-da-Noite, em cujo carácter rasteiro e ardiloso não era possível, em boa verdade, confiar.
A floresta, sabemo-lo, esconde por detrás da bonomia, todo um labirinto de armadilhas; por isso, Alice corria perigo.
Entre uns e outros, a tensão era tão evidente que o próprio húmus faiscava de trepidação. Só o olhar implacável das Sequoias parecia impedir o pior. Naquele dia pardacento e frio.
Em compassado suspense, o bosque aguardava por uma revelação.
Então, um grupo afinado de Árvores-Dodô decidiu falar:
Embora Alice pertencesse à espécie humana, desde os primeiros meses de vida que não era considerada como tal. Alguns membros da floresta não hesitavam em tomá-la como um dos seus, tanto devido aos frondosos e erráticos cabelos, que lembravam vagamente a copa dos Plátanos na primavera, como também devido a uma personalidade forte e incorruptível, que parecia nascida da própria madeira do Ulmeiro. Era quase como se Alice tivesse raízes e as árvores gostassem disso, afirmou convencida a petit Dodô.
Assim, até ver, e mesmo sem o consentimento expresso dos humanos, Alice passaria a fazer parte integrante da floresta, tendo sido a sua custódia temporariamente atribuída à grande família das Cássias-Imperiais, afamadas em todo o bosque pelo extremo rigor e infinita paciência que habitualmente lhes tolda a índole aristocrata.